segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Solidão é lava que cobre tudo



A solidão é um mistério. Como pode ela aparecer quando se está no meio de uma multidão, quando se tem muitos e bons amigos, quando a família é sempre presente? Nunca soube responder essas perguntas. Tudo o que sei é ela vem, de tempos em tempos. Fica um pouco e vai embora, às vezes fica mais. E é aquela sensação estranha de desolação, de que nada trará consolo, mesmo que o cérebro saiba não ser tal sentença verdade. E sempre vem acompanhada de alguma nostalgia, de algo perdido num passado incerto.

Hoje à tarde choveu. E nas gotas geladas da chuva mansa após a tempestade, recebi a visita da solidão. Andando na rua sem guarda-chuva, me esgueirando sob os beirais, a cada pingo sentia o desconsolo de um domingo que ia embora. Nenhum lugar onde pudesse ir, ninguém que quisesse visitar. Somente eu com meus passos de pés molhados, com lembranças de outras chuvas, perdida numa hora de outros anos. E olhar as pessoas o meu redor só reforçava o desejo de um abraço que eu não teria naquele minuto – mas será que um abraço me restituiria a razão? Não sei, não sei. Não sei nem se queria realmente esse abraço, ou se só queria me sentir melhor. Entrei em minha casa vazia, uma casa nova à qual ainda não me acostumei, uma casa que ainda não me parece um lar. Ao som de músicas antigas, fotografei o sol se pondo entre nuvens e chuva, numa mistura de cores e texturas, que sempre me lembram qualquer coisa que não é de agora, nem de hoje.

E a cidade se esvazia para o natal, o que me deixa a sensação de um breve abandono. Ninguém me abandonou. Tudo em sua rotina. Suspeito apenas que a sanidade tenha me abandonado, só para dar espaço para mais uma visita da solidão. Que vem como se estivesse acompanhada de uma multidão, invadindo todos os espaços do meu ser. Talvez esteja acompanhada, sim. Acompanhada de cada fantasma do passado. Fantasmas de porão. Como eu não tenho um porão, os fantasmas vagam por aí e um dia nos encontramos. Sob uma chuva mansa e gelada, numa tarde de domingo vazia.