Caminhar é pular etapas passando por cada uma. É deixar para trás e encontrar logo mais à frente. É suspender o tempo por um tempo e, de repente, nossa, quanto tempo passou!
Caminhar é pular buracos, tropeçar em buracos. Virar o pé num piso bom. Pisar na poça sem querer ou tomar chuva de propósito. Fugir do sol mesmo sabendo que não há na Terra lugar para isso.
Caminhar é decidir fazer o percurso todo a pé e desistir no finzinho do caminho. É pensar que se exorcisa o mal como cansaço das pernas e as bolhas dos pés. É sair para tomar ar e sentir mais calor. É aceitar o suor e a experiência. É aceitar também um mundo esburacado e cheio de gente estranha. Mas não, eu não me aceito enquanto caminho. Eu me rejeito, rejeito pela louca ideia de sentir com os pés e pele o perigo das ruas. E o perigo da minha própria companhia, então? Caminhar é a vã tentativa de livrar-me de mim mesma. Como se fosse possível arrancar a própria sombra, dobrá-la e guardá-la no bolso.
20.01.2007