quarta-feira, 23 de julho de 2008

Telefonema



A história que segue é de um tempo pré-histórico, quando ainda não conversávamos por MSN, quando o ICQ era para poucos selecionados pela sorte e essas coisas malucas aconteciam por telefone mesmo. Tem um fundinho de verdade autobiográfica...


"Conheciam-se apenas por telefone, numa dessas coincidências de linha, de chamada errada. Os dois tinha a mesma idade, aniversariavam no mesmo mês. Gostavam dos mesmos livros, das mesmas músicas, dos mesmos lugares. Moravam longe um do outro e sempre prometiam um encontro em breve.

Até que, após três anos de amizade, resolveram se conhecer pessoalmente. A expectativa foi relativamente grande. No fundo, bem no fundo mesmo, cada um esperava achar o amor da sua vida nesse encontro.

Nos dias próximos, acertavam detalhes. Descreviam-se fisicamente: ela alta, nem gorda nem magra, olhos e cabelos castanhos sendo os últimos curtos. Ele, não tão alto para um homem, moreno, olhos e cabelos negros e um detalhe significativo: usava óculos de aros retangulares, no estilo dos óculos do falecido Renato Russo, vocalista da banda Legião Urbana. Isso era importantíssimo, principalmente para ela, que tinha essa banda como preferida.

Combinaram a roupa. Ela, de saia longa verde-musgo e blusa preta. Ele, de camiseta preta e jeans. Iriam se encontrar na entrada do Museu de Arte de São Paulo. Não exatamente para facilitar um programa, mas como melhor ponto de encontro para ambos.

Chegado o dia, ela estava no local com uma hora de antecedência. Queria vê-lo chegar. E a cada um que passava vestido do mesmo jeito, com ou sem óculos, seu coração disparava. Mas eles passavam e não paravam.

O relógio apontou o horário combinado. Que ansiedade, conhecer o rosto daquele com quem se fala há anos! No entanto, ninguém à altura das descrições surgia. Dez, quinze minutos de atraso e nada. Até que pára em frente ao museu alguém não muito alto, moreno, de jeans e camiseta preta. Parou e sentou-se em uma mureta. Nada mal, pensou ela. Mas onde estariam os óculos à Renato Russo? Evidente que com o sol do fim da tarde ele os trocara por lentes e aqueles escuros. Criou coragem e foi até ele.

- Como vai?

- Bem, e você?

- Bem.

Sim, depois de responder à sua pergunta com tanta simpatia só poderia ser ele!

- Você é bem mais bonito do que eu imaginava!

- Obrigado; você também é muito bonita!

E estabeleceu-se uma conversa sobre o tempo, notícias dos jornais das bancas por onde passavam enquanto caminhavam, depois sobre os pratos prediletos de cada um. Nada muito pessoal. Foi quando se ouviu pergunta dele:

- A propósito, estamos tendo uma conversa interessante, você me chamou para andarmos, mas ainda não sei o seu nome!

O coração dela gelou por um segundo, mas logo se recuperou:

- Ora, Arthur, que pergunta mais boba!

- Quem lhe disse que meu nome é Arthur?

O caso estava ficando sério.

- Pelo menos foi o nome pelo qual eu o chamei nos últimos três anos!

- Últimos três anos?!?

- É, ou você não se lembra que seu telefonema errado caiu em minha casa há exato três anos, dois meses e... cinco dias?

- Eu acho que está havendo algum engano. Eu jamais conversei com você pelo telefone e um nome é Rubens, não Arthur.

Agora sim, o que ela temia estava acontecendo. Saiu com a pessoa errada... por outro engano! Mas ela ponderou. Já se passara mais de uma hora do horário marcado para o encontro até aquele momento. Já haviam andado bastante e conversado. Certamente, Arthur não a esperava mais, e não restava a ela outra coisa se não continuar a conhecer Rubens – o que não era má idéia.

- Está bem, Rubens. Esqueça tudo o que eu falei e continuemos a andar. Conheço uma sorveteria aqui perto. Meu nome é Estela.

E o anoitecer, assim como os dias que se seguiram, foi muito agradável para eles.

Enquanto arrumava as malas, Arthur pensava no encontro. Não haveria tempo para dar satisfações. Até houvesse, quem sabe, quando chegasse ao mato Grosso. Não colocariam escuta no telefone dela. Daria a desculpa do parente agonizante, embora abandonasse a cidade fugindo da polícia. Roubara um anel de turmalina de uma pequena loja de bijuterias para presentear Estela. Estava sem dinheiro suficiente para comprá-lo, já que seu preço não era muito baixo. Era acostumado a fazer isso, mas não imaginava que fosse pego ou que o perseguissem dessa vez. Não tardaria e a polícia estaria em sua casa. Uma segunda passagem pela delegacia não seria só passagem.

Estela lhe telefonou, mas jamais tornou a ser atendida. Ao chegar ao Mato Grosso, Arthur deu-se conta de que esquecera o número do telefone de Estela em São Paulo."



6 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Ká!

Legal essa história, hein?! Que bom que ainda escreve. Eu parei... às vezes, apenas rabisco algumas palavras no papel... Acho que o dia-a-dia de trabalho, onde escrevo e leio bastante, faz esgotar minha vontade e criatividade.
Bem, fico feliz que continue a escrever e adorei o texto que vc fez pro meu casamento. Em breve teremos ele em nossos blogs!! Estou muito feliz por continuarmos compartilhando nossas vidas.

Beijos da sua amiga que te ama,
Emilia

Alice Daniel disse...

Gostei da história. Prende a atenção do leitor.
Continua.
Beijos

M. disse...

Sim, pode adicionar, moça.

E, por falar em "Telefonema", o meu chegou aqui um dia desses. Veio de avião. Correios em greve, mas chegou. Ah, deixa eu dizer, o "Telefonema" foi do Oswaldo.

Anônimo disse...

SRTA KARINA.

ADOREI A ESTÓRIA OU DEVO DIZER HISTÓRIA...
O QUE IMPORTA É QUE GOSTEI MUITO.
PARABÉNS E NUNCA SE ESQUEÇA QUE SEMPRE HA TEMPO PARA VC SER AQUILO QUE GOSTARIA DE TER SIDO.

BEIJOS

Anônimo disse...

SRTA KARINA.

ADOREI A ESTÓRIA OU DEVO DIZER HISTÓRIA...
O QUE IMPORTA É QUE GOSTEI MUITO.
PARABÉNS E NUNCA SE ESQUEÇA QUE SEMPRE HA TEMPO PARA VC SER AQUILO QUE GOSTARIA DE TER SIDO.

BEIJOS

Hélio disse...

Lí tudo!
Muito interessante a história!
Simples casualidade ou destino, sobre a chamada errada?

Desde o início não estava errada, hehe.

Beijo! =D